´´Se houvesse um flagrante, do tipo ela agarrada com seu marido ou vestida com seu vestido novo ou com seu colar de pérolas – o verdadeiro – no pescoço, seria fácil. Mas, quando são pequenas coisas que você vai deixando passar porque no fundo ela é boa empregada, honesta, e também porque você tem preguiça de pensar em arranjar outra e ter que ensinar tudo de novo, aí fica mais difícil.
Pode-se despedir a empregada porque ela tem mau humor e mal fala com você dentro de casa? Porque faz o trabalho bem-feito, mas é incapaz de oferecer um chá quando você está jogada na cama com gripe e com febre, e não faz o mínimo, que é perguntar se você melhorou? Digamos que é parte do temperamento dela, e temperamento não se muda. Mas passar anos numa casa sem dar um sorriso e sem dizer uma coisa gentil faz mal. E, segundo me disse uma amiga – sábia –, quando se deita a cabeça no travesseiro e se percebe que a empregada está perturbando, é hora de trocar.
E aí começa a culpa: se ela ficar desempregada por um longo tempo, vai viver de quê? E o pior de tudo: como demiti-la? Maquiavel já dizia que o bem deve ser feito aos poucos e o mal de uma vez só. Em casos como esse, vale uma mentira, porque discutir a relação não leva a nada. Mas e o medo? Aliás, medo de quê? Nas minhas mais loucas fantasias, pensava que ela podia pegar um facão e enterrar nas minhas costas; como se sabe, fantasia não tem limites. Até que me enchi de coragem e disse que minha vida tinha mudado. Que, por força de novos trabalhos, ia precisar de uma secretária e usaria o quarto dela como escritório. As contas já estavam feitas, e generosas: décimo terceiro e férias, três meses de seguro-saúde (que eu pagava), perdão de um bom dinheiro que ela me devia e uma Kombi na porta para levar o que fosse dela – e com o frete já pago. Expliquei que, se ela ficasse mais alguns dias, seria penoso para nós duas, que essas coisas devem ser resolvidas rapidamente, para que doam menos. Como a vida não é fácil, essa conversa começou às 10 da manhã e a Kombi só saiu às 3 da tarde. E eu, que tinha parado de fumar, fumando um cigarro atrás do outro, claro.
Enfim, a coisa acabou. Por causa da culpa e da pena, financeiramente fui o mais generosa que era possível ser e, às 4 da tarde, fumei aquele cigarro do alívio, da paz, da coisa terminada.
Dois dias depois entrou a nova empregada, já em outros termos: três vezes por semana, de 9 às 4, nada de feira, nada de geladeira cheia de legumes estragando, nada de potinhos com coisas misteriosas que nunca tive coragem de abrir por medo de encontrar uma cobra. Agora é comida congelada, acabaram-se as panelas no fogão e, no terceiro dia de trabalho, quando eu disse que ia ao médico, minha nova funcionária me perguntou, com um sorriso, se eu queria que ela fosse comigo. Com essa, ela me ganhou para sempre.
E fiquei pensando que namorados e maridos que nos atormentam a vida são como empregadas domésticas: a gente dispensa mais tarde do que deveria e perde um tempo imenso sendo infeliz.´´
Danuza Leão é cronista, autora de vários livros, entre os quais Na Sala com Danuza 2 (ARX) e Quase Tudo (Cia. das Letras)
Foto: Nana Moraes
Muito estranha minha experiência com a leitura desse texto, sou mais acostumada a conversar com empregadas sobre suas patroas do que com patroas sobre suas empregadas! Tenho uma teoria sobre patroas que jamais contei a nenhuma de minhas amigas e elaborei conversando ao longo de anos com uma delas, uma que sempre diz ter boas patroas e tem mesmo, nunca fica desempregada, as mulheres sempre ligam para ela e a casa dela é equipada. Nunca disse a ela pq acho que é sacanagem dizer isso em ponto cru, mas tenho a impressão que "Não existem boas patroas, existem boas empregadas!" As patroas são boas pq ela é competente e isso se estende a todas as outras... \o/ As patroas querem alguém que além de tudo seja habio em bajular, adular e mima-las!!! Bem, é minha teoria secreta e secretamente dou graças a Deus ao fato de minha amiga ser boa empregada ou ter bons patrões, alguns dos melhores livros que li foi doação/presente de um dos patrões dela!
ResponderExcluirRenata, gosto do texto da Danusa e nao conhecia este, achei o máximo a comparação da relação com a empregada e a relação com marido.rs
ResponderExcluirbjs
Jussara
@Palavras VagabundasEU TB GOSTO A BESSA DAS COISAS QUE EA ESCREVE! BJS!
ResponderExcluir@PandoraPandora, entendo o que queres dizer. mas saiba que em casa só funciona aquela que fica parte da familia, sabes? É tao bom... e tao ser paparicada, por que não? Tb as paparico! Vc ja leu meu POST ´´Sim, eu tenho baba´´? Depois me cconta o que achas, OK?
ResponderExcluirMas as vezes a gente se dedica tanto e... fica frustrada...
Aqui na Thai tenho uma que diz até ´´Madame, a Sra esqueceu de pentear os cabelos!´´... pode? podeeeeee...
Bjs!